Aquela garota do 103


Aquela garota do 103 pediu para ler mais de  minhas poesias. Aquela, que achou meu caderno jogado no corredor e veio me entregar, aquele dia que eu estava de porre caindo pelos cantos. A ruivinha do 103. Ela diz que eu sou boa nisso. Mas acho que ela só tá puxando meu saco. Acho que ela é daquele tipo que não têm amigas. O meu tipo.
Mas eu não sou genial. Não consigo organizar pensamentos em palavras. Ninguém se importa com minhas pseudo confissões. Com meus escarros literários. Ninguém tá nem ai pra minha Ode as ruas imundas e os bêbados insanos.
Eu sou apenas uma fracassada. Um projeto mal feito.
Como vou dizer pra ela que eu nem sei escrever? Que eu não posso escrever. Que eu não sei ler. Que não sou culta, não entendo nada de filosofia. Matemática,  fazeção de bolos, pintação de paredes ou qualquer coisa, qualquer.
Que eu ouço bandas estranhas, que eu não tenho personalidade, nem pensamento próprio.
que eu não sei fazer nada direito, nada extraordinário. Nada com nada.
Ah eu a decepcionaria se ela soubesse que sou prisioneira dos meus medos. Que fui robotizada pelo SNC.
Como dizer pra garota do 103 que aquelas poesias datavam de ontem, de quando eu era inquieta e queria mudar o mundo.
Mas hoje eu assisto tudo em cima do muro. Pois é, Cazuza, pois é.
Hoje ela vem me ver de novo, disse que não bebe, mas que vai trazer cerveja. Simpática a garota ruivinha do 103. Mas vou ter que dizer, que eu não sou como pareço ser, que eu não escrevo como aquela garota morena que conheci outro dia, ou penso como a loira que era minha amiga.
Sei que ela vai me olhar por cima de seus óculos de armações fininhas com certa decepção...
Bom talvez não...
Sei lá...

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